Os irmãos Altair e Rogério Ambrózio, de Irineópolis, no Planalto Norte catarinense, não estavam bem de saúde no final dos anos 1990. Tonturas, vômitos e dificuldade para dormir eram apenas alguns dos sintomas que os atormentavam. E eles sabiam a causa: o manejo da lavoura de fumo.
Eles, que ainda iniciavam na agricultura assumindo as responsabilidades repassadas pelo pais, Bruno e Cecília, não queriam uma vida de mal-estar e insatisfação. Desejavam trabalhar com alegria e saúde. Foi então que passaram a discutir com um grupo de jovens agricultores da região alternativas para largar a fumicultura e continuar garantindo o sustento da família. Dessas discussões veio a ideia de cultivar plantas medicinais.
Hoje a realidade dos irmãos é outra. Em boa parte do ano eles trabalham em um cenário de sonho: 24 hectares plantados com camomila. Nos meses de colheita – agosto e setembro –, as plantas em flor embelezam a propriedade dos Ambrózio e espalham no ar um delicado perfume de mel. Até o pequeno Andrei, filho de dez anos de Altair, corre livre pelos campos floridos, sem medo de se contaminar.
Começo difícil
Mas a concretização desse sonho não foi simples – eles precisaram de muito esforço, dedicação e criatividade para chegar à situação atual. Primeiro era necessário identificar um mercado consumidor para o novo produto. A solução foi simples, porém criativa. Algumas idas aos supermercados da região resolveram. Eles procuravam nas prateleiras produtos de contivessem camomila entre seus ingredientes e perceberam que muitas marcas de erva-mate locais contavam com a planta na mistura. Algumas ligações para essas indústrias foram suficientes para perceber que a camomila estava sendo “importada” do Paraná. Pronto, estava identificado o potencial mercado para receber as plantas que eles tanto desejavam cultivar.
Mas as dificuldades não pararam por aí. Era preciso conseguir as sementes para plantar e tiveram que ir buscá-las em Curitiba. Trouxeram apenas três quilos, o suficiente para plantar um hectare. Nos anos seguintes, eles passaram a produzir as próprias sementes e hoje são autossustentáveis nesse item.
Mas, e a colheita? Estava aí outro empecilho. Eles simplesmente não sabiam como retirar do campo a produção que, na terceira safra, já tinha alcançado volume suficiente para que não pudesse ser colhida com as mãos. Numa das viagens a Curitiba, os Ambrózio conheceram uma máquina de colher camomila, mas o preço, que no início dos anos 2000 já era acima de R$15 mil, tornava inviável a compra do equipamento.
Criatividade
Se não podiam comprar, eles decidiram construir a própria máquina. Com base no que tinham visto na capital paranaense, compraram ferro e, com muita engenhosidade, montaram em 2002 uma máquina de colher camomila. Anos depois, com o crescimento da produção, essa pequena máquina já não dava mais conta do trabalho. E aí, mais uma vez, a criatividade dos irmãos fez a diferença.
Eles tinham na propriedade uma grande e velha colheitadeira de soja e milho, “que só servia para sucata”, observa Rogério. Depois de algumas adaptações, o equipamento, que viraria lixo, passou a servir perfeitamente para colher a camomila.
Em 2016 os irmãos plantaram 24 hectares de camomila e colheram cerca de 12 toneladas, tudo destinado para as indústrias ervateiras de Canoinhas, Três Barras e Rio das Antas. As plantas são colhidas numa altura de 10cm, com flor e parte do caule. Esse produto, considerado misto, serve para ser adicionado à erva-mate. Além de colher, os irmãos secam a planta na antiga estufa usada para o fumo e a moem. Depois, eles mesmos fazem a entrega, fechando a cadeia produtiva de forma quase autossustentável. Eles compram apenas adubo químico e agrotóxicos, mas em pouca quantidade, já que o cultivo é bastante resistente.
Faturamento triplo
A camomila mista é vendida a um preço médio de R$5,00 o quilo, o que, para os irmãos Ambrózio, representa uma lucratividade bem próxima da que alcançavam com o fumo. Para a safra de 2017 eles têm planos mais ambiciosos. Com uma nova adaptação na máquina, vão fazer duas colheitas, a primeira somente da flor, que será comercializada para indústrias de chá entre R$10,00 e R$12,00 o quilo. Depois disso, é só esperar 15 dias que as plantas florescem novamente e ficam prontas para a colheita do produto misto. Faturamento triplo na mesma área plantada.
A camomila é semeada entre 15 de abril e 15 de maio e a colheita acontece até setembro. No restante do ano, os irmãos usam a área para cultivar soja e milho e aí, mais uma vez, a planta medicinal colabora. As raízes e os caules que sobram da colheita servem como adubo verde para as culturas seguintes, aumentando a produtividade e diminuindo os custos de produção. Parte do milho e da soja é usada para alimentar a criação de frango caipira que os irmãos mantêm na propriedade e que também surgiu como alternativa à fumicultura.
E nesse ritmo os Ambrózio seguem em frente, tirando da terra não só o sustento, mas também saúde e alegria. E o pequeno Andrei já decretou: quando crescer, quer seguir cultivando a terra da família. Não é de se espantar, afinal, o cenário idílico em que ele hoje se diverte é bem mais atraente do que a dureza do asfalto do meio urbano.
Gisele Dias – giseledias@epagri.sc.gov.br