Um dos principais ingredientes da cerveja, o lúpulo vem ganhando espaço em Santa Catarina: segundo dados da Associação Brasileira de Produtores de Lúpulo (Aprolúpulo), sediada em Lages, a safra deste ano – que está em fase de colheita até meados de março – prevê uma produção estadual de 10 toneladas. Esses números são possíveis por meio de parceria entre a Epagri, Ambev, Udesc e produtores rurais que incluem fornecimento de mudas, assistência técnica para conduzir o cultivo, garantia de compra da produção e industrialização do produto. Esses esforços conjuntos podem levar o estado a produzir todos os insumos para a fabricação de cervejas 100% catarinenses.
O lúpulo contém uma substância chamada lupulina, que confere o amargor e o aroma da bebida. A planta é uma trepadeira da família Cannabaceae que gosta de frio. Por conta dessas características, a cultura encontrou condições favoráveis no Planalto Serrano de Santa Catarina. Segundo a Aprolúpulo, atualmente 20 propriedades rurais no estado cultivam o lúpulo em uma área de cerca de 20 hectares. No Brasil, a cultura ocupa cerca de 60 hectares e é conduzida por 180 produtores. Marcos Stefanes, presidente da Aprolúpulo, comenta que Santa Catarina é o estado que tem maior percentual de produtores: 27%, seguido de Rio Grande do Sul com 22%, São Paulo com 18%, Paraná com 7%, Minas Gerais com 6% e Rio de Janeiro com 5%.
A cultura do lúpulo é perene, com um ciclo de aproximadamente de 15 anos. A planta tem capacidade de crescer em torno de 4,5 a 6 metros. Segundo a engenheira-agrônoma da Ambev, Mariana Mendes Fagherazzi, a maturidade da planta acontece no quinto ano, e cada uma chega a produzir 600g de lúpulo. Um hectare com plantas maduras pode atingir uma produção de 1 tonelada de lúpulo.
O Brasil, apesar de ser o terceiro maior produtor de cerveja do mundo, atrás apenas da China e Estados Unidos, importa praticamente 100% do lúpulo utilizado nas cervejas. “Isso é uma grande oportunidade de mercado para os agricultores familiares catarinenses, já é uma cultura de alto valor agregado e pode ser produzida em pequenas áreas”, diz extensionista rural de Lages, Pedro Donizete de Souza, que acompanha os produtores do município.
Incentivo à produção
A Epagri tem atuado em duas frentes para fomentar o desenvolvimento do cultivo de lúpulo em Santa Catarina: na pesquisa e na extensão rural. Uma das pesquisas está sendo desenvolvida na Estação Experimental de São Joaquim (EESJ), coordenada pelo pesquisador Felipe Augusto Moretti Ferreira Pinto em projeto que foi aprovado pelo edital universal da Fapesc. Nesse projeto as principais etapas consistem em verificar a adaptação de variedades de lúpulo em São Joaquim e Lages, a influência de diferentes sistemas de condução na intensidade de doenças e pragas, reação das variedades aos patógenos, controle das doenças, elaboração de cervejas e análise sensorial com as variedades de lúpulo e avaliação da qualidade dos cones de lúpulo. Além a disso a EESJ também disponibiliza aos produtores o serviço de diagnose de doenças e pragas na cultura.
Outra pesquisa diz respeito à análise de risco climático, coordenado pela pesquisadora da Epagri/Ciram, Cristina Pandolfo, e que terá os primeiros resultados apresentados no dia 25 de fevereiro, durante o 2º Festival Nacional da Cultura do Lúpulo, em Curitibanos. A pesquisa quantifica, para cada espécie e cada local de plantio, o risco associado aos eventos climáticos considerados críticos para o desenvolvimento das lavouras. Esses dados compõem um documento importante para que o agricultor familiar tenha acesso a financiamentos do Pronaf e na contratação do Proagro. Os dados são preliminares e o refinamento será dado à medida que os resultados de experimentos e cultivos comerciais forem sendo obtidos em Santa Catarina. Mesmo assim, a pesquisadora afirma que a cultura tem potencialidade no estado do ponto de vista climático.
Em outra frente, a extensão rural da Epagri, com a supervisão das gerências regionais de São Joaquim e de Lages, fornecem suporte técnico aos produtores que recebem mudas de lúpulo provenientes da Fazenda Santa Catarina, da Ambev. Esta empresa cervejeira possui um viveiro de lúpulo em Lages com capacidade de produção de 60 mil mudas por ano, que são doadas a agricultores familiares da região. O projeto da Fazenda Santa Catarina conta ainda com uma lavoura experimental de 1 hectare destinada a testes de manejo. A empresa planeja uma unidade de beneficiamento da planta e uma planta piloto para o processamento de lúpulo, onde as plantas fornecidas pelos produtores serão beneficiadas e transformadas em pellets prontos para uso. “Plantar o lúpulo não é suficiente. Existe uma longa cadeia a ser desenvolvida, desde manejo, passando por equipamentos, até o processo de comercialização, e entendemos que a Ambev auxiliar nesta cadeia produtiva”, diz Felipe Sommer, coordenador do Projeto fazenda Santa Catarina.
Potencial do lúpulo em SC
O estudo sobre os riscos climáticos para a cultura do lúpulo irrigado em Santa Catarina, realizado pela Epagri, aponta que ela tem possibilidade de cultivo em todas as regiões do Estado com riscos baixos a moderados, desde que observadas e respeitadas as práticas de manejo agronômico, orientações técnicas especializadas e fornecimento de água por irrigação, se necessário.
A pesquisa foi iniciada em 2021, atendendo à demanda de informações sistematizadas sobre o clima para a recente cadeia produtiva que está se estabelecendo no Estado. “O lúpulo é uma cultura que vem se expandindo rapidamente pelo mundo devido ao aumento da demanda em função da popularização da produção de cervejas artesanais, a busca por cervejas com maiores volumes de lúpulos e à valorização do produto com procedência regional”, afirma a pesquisadora Cristina Pandolfo, uma das autoras do trabalho.
A pesquisa tem autoria também dos pesquisadores da Epagri/Ciram Gabriel Berenhauser Leite, Luiz Fernando de Novaes Vianna e Elisângela Benedet da Silva, e do pesquisador da Estação Experimental da Epagri em São Joaquim, Felipe Ferreira Pinto. O estudo levou em consideração dados de bibliografias e informações obtidas de especialistas e de produtores, tomando-se como referência a fenologia média dos cultivos em Santa Catarina.
Cristina explica que as condições topoclimáticas diferentes em escala local podem alterar a quantificação do risco climático. “Este estudo não leva em consideração especificidades das variedades e ainda temos um longo caminho pela frente para chegar a esse detalhamento. Portanto, representa uma potencialidade geral para o Estado e deve ser revisada em função de informações que vão sendo geradas anualmente em experimentos e em função das respostas dos cultivares em condições comerciais”, diz a pesquisadora. Ela ressalta ainda que os cultivares a serem utilizados devem estar registrados no Registro Nacional de Cultivares do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (RNA/MAPA).
Este estudo soma-se a outros que a Epagri vem realizando de análise de riscos climáticos para as culturas desprovidas de zoneamento para o Estado, com o intuito de orientar os agricultores no cultivo de várias espécies de interesse socioeconômico, de forma a minimizar perdas de ordem climática. Por meio desse trabalho, foram acrescentadas mais de 30 culturas à lista de lavouras com recomendação de cultivo em Santa Catarina. Isso significa que as famílias rurais podem financiar essas lavouras pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e contratar o Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro), um seguro vinculado à linha de crédito. Os beneficiados pelas tecnologias e informações produzidas são agricultores, setores público e privado, incluindo bancos e seguradoras.
A Nota Técnica gerada no estudo de riscos climáticos para a cultura do lúpulo irrigado em Santa Catarina pode ser acessada aqui.
Por: Isabela Schwengber, jornalista – isabelas@epagri.sc.gov.br.
Mais informações e entrevistas:
Felipe Augusto Moretti Ferreira Pinto, pesquisador Estação Experimental em São Joaquim, coordenador da pesquisa com lúpulo na Epagri, fone (49) 3233-8415
Cristina Pandolfo, pesquisadora da Epagri/Ciram, coordenadora da pesquisa sobre riscos climáticos para a cultura do lúpulo irrigado em SC, fone: (48) 3665-5134
Pedro Donizete de Souza, extensionista rural em Lages, fone (49) 99155-6530
Marcos Stefanes, presidente da Aprolúpulo, fone (49) 99105-3451
Na reportagem de nossa equipe de TV, veja com o cultivo de lúpulo é um negócio promissor para a agricultura familiar.